A produção acadêmica que define as políticas públicas como uma unidade de análise ou uma área de conhecimento ainda é relativamente recente no Brasil. Desde o início da década de 1990, alguns estudos em políticas públicas, entre os quais se incluem os estudos de políticas educacionais, vêm referindo à construção dessa área como um campo permeado por obstáculos a serem contornados, conforme indicam Souza (2003a e 2003b), Melo (1999), Azevedo (1997), Azevedo e Aguiar (2001a e 2001b). Entre as dificuldades para a construção desse campo de estudo estão as questões epistemológicas. Alguns autores têm indicado falta de consistência teórica e ecletismo na conformação da base teórica dos trabalhos em políticas educacionais (TELLO e ALMEIDA, 2013; TRIVIÑOS, 1987). Em face desses diagnósticos apresentados pela literatura esta pesquisa se voltou à problematização da produção acadêmica em políticas educacionais e tomou como objeto teses e dissertações produzidas no período de 2000 a 2010. No universo de cursos de pós-graduação em educação no Brasil, a coleta de dados incidiu sobre os cursos com nota igual ou superior a cinco na avaliação trienal de 2010 da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Neste estudo foram analisados 1.305 resumos de teses e dissertações defendidas nos programas de pós-graduação das seguintes universidades: PUC/RJ, UERJ, UFMG, PUC/RS, UFF, UFSCAR, UNISINOS, USP, PUC/SP, UFES, UFG, UFPEL, UFPR, UFRGS, UFRJ, UFRN, UFSCAR, UFU, UNESP/MAR, UNICAMP, UNIMEP. A seleção dos trabalhos foi realizada no Banco de Teses da CAPES no ano de 2012.
Os trabalhos foram classificados em nove eixos, a saber: Eixo 1 - Organização da educação, planejamento da educação, administração da educação, gestão da educação; Eixo 2 - Avaliação em larga escala e avaliação institucional; Eixo 3 - Qualidade da educação, qualidade de ensino; Eixo 4 - Estado e reformas educacionais; Eixo 5 - Políticas de Formação de professor, carreira docente; Eixo 6 - Financiamento da educação, controle social do financiamento da educação; Eixo 7 - Abordagens teórico-metodológicas em pesquisas sobre políticas educacionais; Eixo 8 - Análise e avaliação de Programas e projetos no campo educacional; Eixo 9 - Políticas inclusivas. Neste texto analisamos a base teórica apresentada nos 1.305 resumos, independentemente do eixo em que o trabalho foi classificado. Por meio deste exercício intentamos a construção de um panorama da produção em políticas educacionais, situando as escolhas teóricas dominantes, suas possíveis sincronias com os debates relativos à constituição da área, assim como refletir sobre as lacunas observadas em torno dessas produções, conforme elas se apresentam. Verificou-se que a maioria dos resumos, 69% (896), não informou a base teórica que orientou a perspectiva e o posicionamento epistemológicos assumidos. Entre os que anunciaram o referencial, a maioria destacou os autores que serviram como base teórica para a análise do respectivo objeto de estudo. Isto, no entanto, nem sempre se fez acompanhar pela explicitação epistemológica, isto é, a enunciação da relação entre a escolha do autor e sua localização político-acadêmica. Dessa feita, observa-se que boa parte dos trabalhos que constituem o corpus desta pesquisa vão ao encontro dos diagnósticos apresentados desde o início da década de 1990 que acentuam a área de políticas públicas como recente e com uma produção eminentemente horizontalizada, especialmente, no que se refere a definição clara das perspectivas epistemológicas. Portanto, interessa-nos nesta incursão não só evidenciar as tendências sobre as escolhas teóricas, mas também trazer ao debate as concepções de Estado e políticas públicas que tem orientado as produções na área. A partir da noção de Estado ampliado em Gramsci (2000) procuramos situar as implicações deste conceito sobre as noções de políticas públicas, bem como sobre as produções na área. Considerando que parte expressiva da produção pressupõe a noção de política pública como Estado em ação, voltamo-nos para a problematização desta noção como parte importante do movimento de constituição da área. Neste sentido, assumimos políticas públicas como expressão de movimentos complexos que arregimentam esforços de diferentes agentes para dar corpo a séries de ações e comportamentos que produzem repercussões na vida social.
Fil: Jacomini, Márcia Aparecida. Universidade Federal de São Paulo; Brasil
Fil: Almeida Silva, Antonia. Universidade Estadual de Feira Santana; Brasil